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Aos 81 anos Iyalorisa defende tese de doutorado UFPR ( Universidade Federal do Paraná).
“Na infância, não estudei. Fui alfabetizada aos 13 anos. Para o meu pai, as filhas mulheres não precisavam estudar. A gente morava em uma área rural de Guaxupé, Minas Gerais, e não tinha escola perto. Só os filhos homens iam para a escola. Para as meninas, ele inventava inúmeros pretextos. Os anos foram passando, e eu sempre cobrando. Queria muito aprender a ler e escrever. Minha mãe se casou com outro homem e foi morar no Estado de São Paulo. Me mandava cartas mas, como eu não sabia ler, meu pai que as lia. Ele falava o que bem queria.Tentei voltar a estudar aos 18 anos, mas tive que parar de novo, a vida me obrigou. Tentei de novo aos 30 e dei uma nova pausa. Aos 47, concluí a EJA (Educação de Jovens e Adultos). Anos depois, minha filha disse que achava que eu deveria fazer o vestibular. Fiquei assustada, disse que não. Pensei que não fosse capaz de acompanhar o ritmo. Tinha medo de ficar para trás. Mas aí vi em um panfleto de uma universidade o curso de Relações Internacionais, e nele tinha uma disciplina chamada História da América Latina. Sempre quis saber o porquê dessas diferenças entre o Brasil e nossos países vizinhos. Claro que cada país tem sua peculiaridade, mas por que essa rivalidade?
É que Brasil e Argentina, por exemplo, olham para países diferentes. A Argentina está para a Inglaterra assim com o Brasil está para os Estados Unidos.
‘Ouvi de um professor que a universidade não era para mim’
Fiz vestibular aos 63 anos, passei no Centro Universitário Autônomo do Brasil. Estudava muito. Lia até de madrugada para tentar acompanhar. Mas sofri discriminações. Na hora de formar equipes para os trabalhos, ficava só. Eles só me queriam se fosse algo sobre questão racial, por saberem que sou militante. Teve professor me dizendo que o curso não era para mim, que eu deveria fazer serviço social. Fui seguindo desse jeito, persistindo.
Aos 72 anos, comecei o mestrado em Tecnologia pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Entrei e foi mais suave. Já estava mais descolada, mas mesmo assim o racismo estava sempre presente. Não tem como não aparecer porque é institucional. Está em todos os meios. Aí tem uma hora em que a gente tem de fingir que não entendeu.
Um dia, fui para a universidade com um botão em que estava escrito “inclusão”. Uma professora olhou para mim, na sala de aula, e sem falar meu nome disse: “Não sei o que que eles acham que tem que incluir”. Recebo muitos e-mails falando de inclusão, mas nem leio”. Fiquei quieta e fingi que não era comigo.
Concluí o mestrado aos 74 anos e, depois, fiquei um tempo fora da universidade por outras razões, por questões da vida mesmo. Mas segui em frente nos estudos.
Sigo em frente porque me lembro de minha mãe me incentivando. Meu pai dizia que eu não era inteligente, mas minha mãe sempre exaltou minha inteligência.
E eu persisto. Comecei o doutorado em Educação na UFPR (Universidade Federal do Paraná) e, logo, a pandemia começou. Não digo que ela me desestimulou, mas atrapalhou bastante o processo. Os estudos foram todos online. A gente tinha dificuldade para se encontrar. Fiquei um pouco isolada mesmo pela necessidade, por causa da pandemia e porque não queria correr o risco.
Quando comecei o doutorado, meu glaucoma [doença ocular] piorou. Fiquei um bom tempo sem enxergar quase nada. As pessoas me guiando para eu não cair. Mas fomos nos adaptando, insistindo, até a conclusão do curso. Não sei se vou fazer um pós-doc. Não digo que não vou porque tudo que disse que não queria acabei fazendo.
“Vontade da minha mãe foi cumprida”
A gente sempre teve as dificuldades mas, agora, com as políticas afirmativas e, se a gente conseguir garantir, teremos o caminho nas mãos. Não tem idade determinada para quem quer estudar.
Há muitas mulheres que servem de inspiração. Aqueles que não tiveram oportunidade mas correram atrás. Aquelas que estão querendo mudar a sua história de vida. Estão na medicina, na odontologia. Principalmente as mulheres negras.
Meu orgulho é saber que a vontade da minha mãe foi cumprida. O doutorado, para mim, é um ponto aonde eu não acreditava que conseguiria chegar, mas cheguei. A todas as mulheres que querem chegar: estudem. A educação é o caminho.”
*Dalzira Maria Aparecida, 81, mora em Curitiba, é mãe de santo e doutora em educação pela UFPR (Universidade Federal do Paraná)
credito:
Maravilhosa!!!!
Asé!!!
GUERREIRA!
VOCÊ É EXEMPLO DE QUE QUERER É PODER.
PARABÉNS PELA FORMATURA, POR VENCER TODOS OS PRECONCEITOS E DIFICULDADES DA VIDA.
VIVA VOCÊ!!!
Asé para as mulheres Pretas de terreiro!!!